Dados relacionais

O encontro, a percepção do outro e das situações enquanto elas próprias estabelecem os referenciais, os contextos do comportamento humano. Caso os problemas, as angústias, os medos e os desejos se interponham nestes referenciais, começam a surgir distorções, problemas gerados pelos posicionamentos autorreferenciados. O encontro é, então, transformado em objeto que impede ou facilita a consecução de objetivos, e assim, o outro é esmagado seja como objeto retirado, seja como apoio facilitador. Este processo autorreferenciado transforma os dados relacionais em resultantes do que se quer vivenciar, do que se quer atingir, pouco significando enquanto realidade vivenciada. Sem diálogo com o que ocorre, com o presente, começam a existir verificações atordoantes, tanto quanto merecedoras de posições balizadas por sucesso ou fracasso.

O indivíduo se transforma em um sistema de convergência, e também em um sistema divergente ao se afastar do que não interessa a seus propósitos. Tudo que ocorre sequer é percebido, pois não faz parte da configuração de propósitos.

Manipular vivências, fazê-las convergir para o que se deseja conseguir, ou provar, é uma forma de pontualizar, de fragmentar os acontecimentos. Muitas famílias, por exemplo, no afã de criar super cidadãos, incentivam maldades: deixam os filhos brincarem de destruir, de matar, pois assim, eles aprendem a enfrentar adversidades. “Ser forte, ser macho, agir como homem” é afirmação de muitos pais que acreditam estar formando vencedores. Em nenhum momento questionam os critérios de vitória, de força e os atributos qualificadores de seus preconceitos. Não pensam nas implicações, não vêem que ao valorizar forte e bom como o macho, o homem, o poder, estão condenando mulheres, mães e esposas. Querendo criar o super macho, criam o super misógino, na prática, disfarçado como Dom Juan. Vivenciar as implicações das escolhas e propósitos muito esclarece. Saber que querer já é poder, quando tudo pode ser destruído para validar desejos, é uma reflexão necessária.

Tudo está sempre em relação com tudo e não perceber isto ou negar esta evidência é transformar os dados relacionais em protótipos, em gavetas cheias de coisas escondidas, de coisas superadas, ou cheias de ferramentas mágicas que podem manter ilusões: prestidigitadores decepcionam na continuidade das vivências, embora encantem no instante, na precipitação abismal das superposições agregadas, produzidas por aderência e justaposição de dados relacionais.


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